Ainda numa ode a Eugénio... que só agora "entendo" enquanto pessoa.
Adeus
Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.
Meto as mãos nas algibeiras
e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro!
Era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes!
E eu acreditava!
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos,
no tempo em que o teu corpo era um aquário,
no tempo em que os teus olhos
eram peixes verdes.
Hoje são apenas os teus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.
Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor...
já não se passa absolutamente nada.
E, no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.
Não temos nada que dar.
Dentro de ti
Não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.
Adeus.
05 January, 2009
This was a
epiphany,
quote
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3 thoughts unleashed:
As palavras acabam sempre por se gastar, apagar, deixam de fazer sentido...
Depois vêm o Silêncio, a indiferença...
Ou
A SAUDADE....
;)
Muito, muito bom!!!
Beijo
andas numa de poemas... continua assim!
todas as palavras se gastam, todos os bons momentos se acabam, apesar da grande vontade de os continuar...
Talvez se as palavras não fossem todas ditas e repetidas num só momento, talvez tivessemos poder de os perpetuar para sempre...
=)
belo poema. Fazia um tempo que não me lembrava dos poemas de Eugénio de Andrade. obrigada :)
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